DIREITO, ECONOMIA E MERCADOS RACIONAIS
(UMA CRITICA AOS ECONOMISTAS ¨RACIONAIS¨)
Introdução
Quantas crises ainda serão necessárias para que os fatos prevalecem sobre ideologias bem estruturadas, mas que geram o caos? Que camufla a selvageria dos mercados com uma teoria econômica que, há mais de dois séculos, nega os fatos e atualmente corre na contramão do direito. Acredito que, em vez de continuar a enaltecer as suas virtudes e propagar a sua suposta eficácia, devemos mostrar o fracasso de seu arcabouço teórico.
Para a grande maioria dos economistas as palavras racionalidade e mercados perfeitos são sinônimas e estão associadas à busca racional e individual pelos interesses próprios, gerando como consequência benefícios para todos. Como os mercados são perfeitos não existe risco de crise.
A teoria tem sua origem na célebre frase citada por Adam Smith em sua obra ¨A riqueza das nações¨, escrita no final do século XVIII. Basicamente, a versão do texto original do pensador é:
¨...e ao dirigir essa atividade de maneira que seja de maior valor possível, ele tem em vista o seu próprio lucro, e neste caso, como em muitos outros, ele é guiado por uma mão invisível a promover um fim que não fazia parte de sua intenção. E o fato de este fim não fazer parte de sua intenção nem sempre é o pior para a sociedade. Ao buscar seu próprio interesse, frequentemente ele promove o da sociedade de maneira mais efeciente do que quando realmente tem a intenção de fazê-lo¨ (www.pensador.uol.com.br/invisível/. Na verdade outras versões podem existir mas não divergem basicamente desta, nem de seus fundamentos e termos. Esta parece ter sido a original.
Através de pesquisa na internet encontrei um comentário que, particularmente, em face da sua clareza e objetividade, devo reproduzí-lo, pois se ajusta ao que me proponho, sem distorcer a citação ¨original¨: ¨A mão invisível do mercado foi uma analogia empregada por Adam Smith para explicar como em uma economia concorrencial, a busca pelo interesse individual pode resultar em melhoria para o bem comum. Segundo o pensador escocês há um mecanismo natural no mercado que distribui socialmente, de alguma maneira, os ganhos individuais (www.monitormercantil.com.br).
Inicialmente, sem entrar na análise da citação, o que se percebe é que Smith em nenhum momento empregou a palavra RACIONAL e nem fez qualquer menção ao fato de a economia nunca entrar em crise. Pelo contrário, utiliza palavras vagas como: nem sempre é o pior para a sociedade, frequentemnte, de maneira mais eficiente do que quando, que podem sugerir outra interpretação. Ora, frequentemente não é sempre e ¨de maneira mais eficiente do que quando¨ significa apenas uma comparação com uma outra situação, qual seja a de não procurar o interesse explícito da sociedade. Tomarei esta questão mais afrente.
Uma outra versão da eficiência dos mercados, no fundo, um tanto parecida com esta, foi formulada pelo economista Jean-Baptist Say, conhecida pela célebre frase de que ¨a oferta cria sua própria demanda¨, não havendo possibilidades de superprodução, ou melhor crises, pois como está evidente, pela própria menção, o equilíbrio geral prepondera na economia. Entretanto, como a frase de Say era mais direta, não permitia tantas divagações e seria mais fácil de ser contestada cedeu espaço para a teoria da mão invisível.
Tendo sofrido uma crítica contundente de Marx, pensávamos que esta última teoria estaria definitivamente sepultada com a divulgação da Teoria Geral de Keynes. Mas, infelizmente, ela retornaria, mesmo por um breve período de tempo, durante o governo de Ronald Reagan, para ceder espaço novamente a teoria dos mercados perfeitos. Portanto, passada a crise que assolou o mundo em 2008, não seria surpresa que a teoria dos mercados racionais e perfeitos retornasse com uma nova roupagem, com perfumaria diferente, mas com os mesmos fundamentos. Daí a necessidade de sepultá-la mais uma vez.
Existiu ainda uma outra versão conhecida como a teoria do laissez-faire. Todos os caminhos levavam a Roma, mas a teoria dos mercados perfeitos tem mais apelo emocional. Afinal, na atual conjuntura, quem gostaria de ser considerado irracional?
O significado de racional e o inconsciente
Mencionemos alguns significados importantes da palavra ¨racional¨, segundo www. dicio.com.br: dotado de razão, que possui coesão, que se baseia no raciocínio, que implica ponderação, bom senso. Segundo o www.dicionárioinformal.com.br racional seria a pessoa que pensa antes de tomar certas atitudes. Os sinônimos para a palavra são: lógico, claro, inconteste, consequente, razoável. E os antônimos seriam: irracional, emocional. Em suma podemos concluir que a palavra racional signica o uso da razão, da prudência, do raciocínio dedutivo e indutivo, que aprende com a experiência, sopesando os prós e os contras para tomar a decisão mais apropriada, lógica e coerente.
Muito embora Adam Smith jamais tenha se utilizado da palavra racional, é possível que com o advento e o avanço da psicanálise, a teoria econômica clássica introduziu a palavra na citação de Smith, dando-lhe um ar de cientificidade, ou seja, fazendo uso ideológico da mesma, pois não deu uma definição precisa de seu alcance. Na época de Smith não existia a noção de inconsciente posteriormente formulada por Freud.
Nesse sentido a palavra serviu como um escudo para o questionamento da mão invisível. Posteriormente, com o advento da psicanálise, passou-se a questionar a racionalidade do ser humano muito embora a mão invisível sempre tenha sido o fundamento da teoria dos mercados perfeitos. De qualquer forma, a teoria econômica clássica nunca abriu mão de suas premissas. A mão invisível estaria lá para cumprir suas tarefas, corrigir as imperfeições, caso o comportamento humano racional fosse seriamente questionado.
Mas, primeiramente tinha-se que combater a questão da racionalidade. Duas batalhas. Esta seria a válvula de escape. Na verdade uma construção teórica bem arquitetada. Não raro se ouve falar em mercados racionais como sinônimo de mercados perfeitos, consequência lógica de comportamentos considerados ideologicamente racionais. Vejam que aqui não se discute o problema da intencionalidade, o que poderia nos levar ao desejo de avaliar o quanto estes termos foram colocados e utilizados de forma proposital, escolhidos a dedo, para encobrir a realidade. A ideologia é um componente social, não racional, que dá coesão a sociedade.
Mas, convenhamos que existem comportamentos humanos que não são dotados destas qualificações e que nem por isto deixam de ser racionias. Então, de que forma a teoria econômica irá resolver este impasse? Como esperar que desta miscelânea de comportamentos racionais e de outros que não possuem as qualificações de racionalidade, mas que não deixam de ser racionais, no sentido lato, posto que também se faz uso da razão, ocorram sempre resultados satisfatórios?
Também, a citação de Adam Smith não faz menção ao fato de que as economias capitalistas são imunes as crises. De fato ele menciona os benefíicios para a sociedade, mas estes benefícios podem simplesmente ser considerados em um longo prazo, tal como um progresso a longo prazo, mas que em nada significa ausência de dificuldades, ou melhor, de crises periódicas.
Por tudo isso, as palavras inicialmente proferidas pelo renomado economista foram distorcidas por questões ideológicas tomando este formato: os seres humanos ao procurarem os interesses individuais egoistas, através de comportamentos exclusivamente racionais, são conduzidos por uma mão invisível, que sempre promove o bem estar geral da sociedade, sem a possibilidade de crises. Muito diferente do que mencionou o referido autor.
Mas, ao contrário do que se aprende com a teoria econômica o agir e a busca pela satisfação individual não produz necessariamente resultados satisfatórios ou condizentes com os objetivos almejados.
O agir e o pensar não são exclusivamente racionais. Lembrem-se de que Freud ainda está vivo, embora sempre contestado. Pensando dialeticamente, a busca por benefícios próprios não significa vantagens e benessis para todos. O todo não é a soma das partes (Marx, Engels). Vejam os exemplos, já bastante difundidos, de uma torcida em um campo de futebol e de uma plateia no incêndio de um teatro. No momento do pânico ou crash os comportamentos racionais cedem aos de manada. E quanto a isto, nos soa bastante sugestivo o título do clássico livro de Charles Kindleberger, Manias, Pânico e Crashes.
Ora, os limites entre o comportamento racional e ¨irracional¨, melhor falar em inconsciente, nunca foram clara e cientificamente definidos. Ações, comportamentos inconscientes, preconceitos, convicções íntimas, atitudes irracionais podem ter o manto da racionalidade quando explicados e justificados racionalmente. A racionalidade se ajusta ao que nos propomos justificar. Para esta situação a psicanálise utiliza o termo racionalizar que significa justificar com motivos racionais, ou seja, utilizando a razão, atos e condutas provocados por elementos não racionais ou inconscientes (www.dicionarioinformal.com.br)
A história está repleta de exemplos. Durante a loucura do nazi-fascismo, até mesmo filósofos e juristas aderiram as ideias de seus líderes políticos, que souberem despertar e manipular os sentimentos adormecidos do ódio, da vingança e outros, assunto abordado por Freud. A psicologia das massas trata deste ¨enígma¨ humano. Modelos matemáticos sofisticados, aplicados à economia, são extremamente racionais, mas ineficazes e danosos quando partem de premissas ou pressupostos falsos. Servem, quando muito, para iludir e induzir leigos a erros, disfarçando os pressupostos e a realidade, represando, concentrando e destinando o poder das informações e decisões àqueles que sabem como manejá-los. Ou seja, criam uma barreira psicológica e excluem os mais leigos do conhecimento e da realidade dos fatos e os enganam.
Não existe esta racionalidade e eficiência genérica que serve a todos os propósitos, circunstâncias e atua com a mesma intensidade em todos os momentos. Poderíamos, até mesmo, pensar em outros ¨componentes ¨ do comportamento humano, tais como o papel do feeling nas decisões (de risco empresarial), a influência da cultura e costumes, a fé, a perseverença, a habilidade em lidar com diferentes situações e a impulsividade, que, por sinal, não é necessariamente de natureza inconsciente. Os diversos tipos de comportamentais tidos como ¨irracionais¨ não podem ser considerados indistintamente como não racionais, num sentido pejorativo, pois possuem conotações psíquicas e cargas emocionais diferenciadas, além de possuirem algo de ¨misterioso¨. Atuam, pois, de forma conjunta, positiva e/ou negativamente nos processos racionais, sem que se possa racionalmente determinar e quantificar a dosagem específica. A estória da fundação da CNN por Ted Turner pode servir de exemplo da importância do feeling nas decisões, ao contrário daqueles que depositam todas as suas esperanças e raciocínios no comportamento racional do ser humano.
Outras evidências teóricas sobre a irracionalidade
Hoje, os estudos mais avançados demonstram que o comportamento humano não se restringe ao racional e irracional, no sentido psicanalítico do termo. Cito Leonard Mlodinow, em ¨Subliminar¨, Ed. Zahar, ed¨¨. 2012:
¨De acordo com um livro-texto sobre filosofia humana, o sistema sensorial humano envia ao cérebro cerca de 11 milhões de bits de informação por segundo. A verdadeira qauntidade de informação com que podemos lidar foi estimada em algo entre dezesseis e cinquenta bits por segundo¨(p. 43),
¨Estudos mostram que as pessoas tomam decisões morais diversas depois de assistir um filme alegre, e que as mulheres, quando estão ovulando, usam roupas mais provocantes, tornam-se mais competitivas sexualmente e ampliam sua preferência por homens sexualmente competitivos¨(p. 210/1).
¨O comportamento social humano é obviamente mais avançado e cheio de nuances que o do arganaz e dos carneiros. Ao contrário deles, nós temos ToM e somos muito mais capazes de superar impulsos inconscientes tomando decisões conscientes. Mas, nos seres humanos, a oxitocina e a vasopressina também regulam os vínculos com os semelhantes. Nas mães humanas, assim como nas ovelhas, a oxitocina é liberada durante o parto e o nascimento. Também é liberada na mulher quando os seus mamilos ou o colo do útero são estimulados durante a relação sexual; e nos homens e nas mulheres quando eles chegam no clímax sexual. Tanto nos homens quanto nas mulheres, a oxitocina e a vasopressina liberadas no cérebro depois do sexo produzem amor e atração¨ (p.114).
¨Em outro estudo, no qual os participantes deviam investir dinheiro, os investidores que inalavam oxitocina tendiam a mostrar muito mais confiança em seus parceiros, que eram levados a aplicar mais dinheiro com eles¨(p.114).
¨Os cientistas descobriram que homens que têm duas cópias de uma determinada forma desse gene têm menos receptores de vasopressina, o que os torna semelhantes aos arganazes promíscuos¨(p.115).
No tocante a impulsividade é provável que a neurociência, num futuro muito próximo, possa contribuir para elucidar e colocar um ponto final nesta questão. Mas, não precisávamos do avanço da genética para constatarmos estes absurdos teóricos.
Por outro lado, as etapas e os lapsos entre análise, avaliação e execução podem ter ¨racionalidades¨ e cargas emocionais diversas, sem que se possa garantir os resultados previamente traçados. Pergunata-se: se a racionalidade é tão importante por que a propaganda e a sua evolução para a propaganda subliminar? As pessoas se comportam e tomam decisões diferentes como consumidores e produtores. Não existe esta racionalidade ¨genérica¨ que a todos governa, independentemente de serem consumidores, produtores, crianças, adultos, idosos e até mesmo homens e mulheres. Vide a indústria da moda. Já pensaram em um artista sendo pura e exclusivamente racional? Sem dúvidas, poderíamos prever o seu fracasso. Ou mesmo um Garrincha racional?
Não precisa ser um expert em economia comportamental, tão em voga, para concluirmos que a suposta racionalidade, decantada por esta ideologia extrema, não traz as soluções necessárias ao bem estar de todos.
A RACIONALIDADE DOS ECONOMISTAS RACIONAIS
Mas depois de todas essas citações, que mostram os avanços científicos dos últimos anos, cabe uma pergunta. Onde estavam os economistas RACIONAIS que não acompanharam o desenvolvimento das outras ciências e continuavam a insistir num comportamento racional do ser humano, formulando uma teoria absurda, baseada apenas numa citação de um economista do século XVIII?
Repetiram tanto essas mentiras, talvez por serem espertos demais ou mesmo irracionais, aí reside o paradoxo, que terminaram por convencer a si mesmos e aos outros mortais. Agora, depois da tempestatade, ainda têm a ousadia de dar sugestões para sair da crise. Sempre com a mesma falta de criatividade, ou seja, menos governo. Muitos de seus esforços se voltam para comprovar e concluir que a ¨culpa¨ foi do governo. Formularam modelos matemáticos sofisticadíssimos para convencer os outros de suas idéias pré-concebidas.
E se alguém ainda tem dúvidas de que as fraquezas da ¨alma¨ humana (ciúme, inveja, vingança, ganância, vaidade, etc) dominam a racionalidade nos assuntos econômicos sugiro o livro de Macdonald, Lawrence G, Uma colossal falta de bom senso, editora Record, 2010, sobre os bastidores da quebra do Lehman Brothers.
¨Ninguém poderia dizer que não houve tentativas e esforços enormes para tentar salvar o banco, mas a rinha entre Paulson e Fuld era fato¨ (p.382). ¨Foi um encontro antagonístico entre dois velhos inimigos¨ (p. 366).
Quando muitos esperavam a salvação do Lehman, em decorrência do contágio que o quarto maior banco dos Estados Unidos poderia causar à economia, aconteceu o contrário:
¨Eu estou onde estou por muito mais tempo que você esteve no seu assento no Goldman, retrucou Fuld. Não venha me dizer como tenho que tocar a minha firma. Eu farei as coisas no seu devido tempo. O secretário do tesouro olhou furioso e naquele momento a sorte do Lehman estava selada. A inimizade, por parte de Paulson, foi intensiificada após o jantar. Paulson considerou que o chairman do Lehman demonstoru uma mescla de arrogância e desrespeito¨(p 367).
¨E se Dick Fuld mantivesse sua rudeza, raiva e ressentimento sob controle? Principalmente no jantar privado com Hank Paulson, secretário do tesouro americano de Bush. Foi quando seus anos de inveja do Goldman Sachs vieram à tona e levaram Paulson a sair furioso com a falta de respeito com que Fuld tratou a instituição da secretaria do Tesouro. Talvez esse tenha sido o momento em que Paulson tenha decidido que ele não poderia tolerar o resgate do banco controlado por Rickard S. Fuld¨(p.19).
¨O Goldman era um acionista de peso da AIG e parte de mais de U$ 10 bilhões em swaps de crédito da seguradora. Vários funcionários do Lehman queriam saber por que o plano de salvação do Lehman, proposto no fim de semana, era tão público e notório, com mais de oito bancos comerciais e de investimentos fuxicando tudo dentro das gavetas do Lehman, enquanto o plano de recuperação da AIG alguns dias depois foi cercado de mistério¨ (p.388)
Sobre o ambiente interno no Lehman: ¨Havia histórias horríveis sobre o temperamento de Dick Fuld. Sobre suas ameaças, vinganças e acessos de histeria e raiva. Era como se estivesse ouvindo a história de um leão enjaulado¨(p.111).
Mesmo após crise, o laureado professor de econimia Eugene Fama, um reconhecido e ferrenho defensor dos mercados eficientes, formador de opinião, foi agraciado com o Prêmio Nobel. Melhor: ¨Eugene Fama é conhecido pelo pai da ¨hipótese dos mercados eficientes¨, segundo a qual se reconhece que os mercados incorporam toda a informação relevante na avaliação dos ativos, sendo tolice alguém tentar prever a evolução dos preços¨ (em WWW.publico.pt). Com todo respeito ao autor a primeira parte da oração não leva necessariamente à conclusão. Há algum tempo, o professor Edmar Bacha, em uma entrevista, posteriromente publicada, falou algo assim: em determinadas ocasiões é possível modelar. Evidentemente, não em momentos de especulação ou crash. O erro é generalizar.
Como consequência dessas elaborações teóricas também é conhecida e difundida a ¨tese¨de que é impossível ganhar dos mercados. No entanto, para a tristeza dos crédulos, que seguem os seus ensinamentos, o mercado está cheio de milionários financeiros. Diga-se de passagem, fazendo fortuna com o dinheiro dos outros. Relambrando o velho ditado: ¨o pior cego é aquele que não quer ver¨.
Cito passagens do livro ¨O mito dos mercados racionais¨, Fox, Justin, Ed. Best Seller Ltda, ed. 2010: ¨O que Reder queria dizer com essas duas frases infelizes era que os acadêmicos de Chicago atacavam quase todos os problemas econômicos com a premissa inicial de que , se não houvesse interferência do governo, o mercado sabe das coisas¨(p.120).
Ainda: ¨Fama citou a enorme quantidade de indícios compilados nos dez anos anteriores que mostravam que era difícil prever o mercado e que ele se movia com rapidez impressionante (aluguma novidade?). ¨Resumindo¨, concluiu, ¨as provas que sustetam o modelo de mercados perfeitos eficientes são muitas e (algo muito singular em economia) as provas em sentido contrário são escassas¨(p.137). Ou seja, não se definiu, não disse nada.
O poder de tanta racionalização pode ser constatado nesta citação: ¨Fama juntou forças com Merton Miller para escrever The Teory of Finance, o primeiro livro didático a juntar os diferentes fios que foram tecidos nos vinte anos anteriores. O livro era árido e excessivamente cheio de equações para servir a muitos cursos de MBA fora da Universidade de Chicago. Mesmo assim, foi um marco. A disciplina das finanças renascera para as universidades¨(grifo meu).
Continuando: ¨Em minha primeira aula com Merton Miller, ¨ele explicou a teoria dos mercados efecientes¨, lembrou Rex Sinquefield, um ex-seminarista católico que começou o cursoo de MBA no outono de 1970. ¨Depois de dez minutos, tive a sensação de que aquilo tinha de estar certo. Aquela idea, para mim, era muito poderosa. E eu disse a mim mesmo:¨Essa é a ordem do universo¨(p.137/8).
Partiu de um mundo hipotético, não real, por que na pior das hipóteses deveria admitir que o tráfico de influência, as possibilidades de manipulação e as informações privilegiadas, eram reais e comuns no mercado financeiro. Esqueceu-se que nos anos de sua pesquisa vivia-se sob a influência e o domínio das ideas keynesianas, associadas a uma época pós-guerra, que repercutiram em um dos grandes progressos econômicos da era do capitalismo. Por isso, ¨a enorme quantidade de indícios coletados¨ e os seus modelos deveriam estar em dívidas com a realidade. Ou melhor, os dados estavam viciados.
São senhores tão absolutos da verdade, com pensamentos que encontram eco nos grandes interesses econômicos, mas não se deram ao mínimo dissabor de admitir que podiam estar sendo incoerentes. Faltou humildade, tão necessária aos verdadeiros cientistas. Vejam o exemplo do Sr. Greenspan.
Quanta improdutividade, irracionalidade e racionalização, que nos levou ao caos. Alguns deles se especializaram numa nova corrente chamada economia comportamental para comprovar que o ser humano não é só racional, o que já tinha sido feito de forma mais produtiva e científica. Mas, também não questionaram de forma explícita como a economia estava sendo conduzida. Eram filósofos cúmplices, falsos psicólogos. Choveram no molhado e muito mal.
OS AGRACIADOS COM O NOBEL
Foram e ainda continuam sendo agraciados com o Prêmio Nobel. Estavam alienados do mundo e repetiam as mesmas bobagens. E o pior, ganhavam dinheiro com isto. Se convenciam, talvez em benefício próprio, de suas próprias mentiras que encontravam repercussões e apoio nos interesses econômicos. Ora, ¨o uso de cachimbo faz a boca torta¨. E quem sabe, é sempre bom enganar os ingênuos com teorias bem elaboradas, pois traz sensação de poder.
A lista de vencedores do Prêmio Nobel que direta ou mesmo indiretamente contribuiram e apoiavam a teoria dos mercados eficientes e da existência da mão invisível smithiana é enorme. Alguns tentaram se converter, mas não se tornaram críticos ardorosos. Os arrependidos quando muito tentavam encontrar situações específicas em que ela não funcionava. Alguns não afirmaram, nem negaram explicitamente. São apontados com um *. Outros se tornaram viciados irrecuperáveis. Vejamos os pirncipais nomes com base na Lista de Persongens do livro de Justin Fox, já citado, sem ordem cronológica:
* Kenneth Arrow (1972); Friedrich Hayek (1974); Milton Friedman (1976); Roberto Lucas (1995); Harry Marcowitz (1990); Robert Merton (1998); *Merton Miller (1990); Myron Sckoles (1997); Herbert Simon (1978); * Eugene Fama (1990), defensor ardoroso que nunca se converteu totalmente. Pela importância do cargo que ocupava, não poderíamos deixar de citar Alan Greenspan, embora não tenha recebido o Prêmio. É provável que existem outros, mas não vale a pena procurar. Seria cair na ¨irracionalidade¨ e improdutividade. Citamos os mais destacados e me parece ser o suficiente.
Ben Bernankle, considerado um brilhante economista, que assumiu o comando do FED, fazia parte dessa CONFRARIA. ¨Intitulado ¨A Grande Moderação¨, o discurso se referia a uma nova e ousada era econômica em que a volatidade - os espamos e as sacudidas que atormentavam a vida e as carteiras das pessoas - seria permanentemente erradicada. Segundo ele, uma das principais forças por trás dessa Shangri-lá econômica era ¨uma sofisticação e uma profundidade cada vez maior dos mercados financeiros¨ (Patterson, p. 25).
Merece menção honrosa Myron Scholes que, com o colega Fisher Black, inventou o conhecido e sofisticadíssimo modelo Black-Scholes, referência de precificação de opções. Lançou e se afundou no fundo de hedge Long-Term Capital Management, que foi a falência.
¨Boa teoria. A pequena falha dessa teoria foi descoberta somente depois dos fatos: quando o mercado entra em queda livre e ninguém quer comprar, é impossível vender a descoberto. Se muitos investidores tentam ao mesmo tempo vender ações quando o mercado cai, criam o próprio desastre que estão buscando evitar¨ (em Lrwis, Michael, Pânico, Ed. Campus, 2010, p. 2).
Destaque também para Paul Samuelson (1970) e Joseph Stiglitz (2001). Quanto a Samuelson escreve o citado autor: ¨... criou a primeira prova matemátiva da hipótese dos mercados eficientes...¨ (p.397). Quanto a Stiglitz cita o mesmo autor: ¨Influenciado pelo trabalho de Kenneth Arrow, mostrou como a hipótese dos mercados eficientes não poderia - pelo menos em teoria - ser totalmente verdadeira¨ (p. 398). Pasmem. Quanta racionalidade improdutiva e irresponsável.
Se querem um exemplo do racional irrecuperável lhos dou: ¨Jens Carsten Jackwerth, professor visitante de pós-doutorado da Universidade da Califórnia em Berkley, e Mark Rubistein, coinventor do seguro de portifólio, ofereceram uma prova incontestável de que o dia 19 de outubro de 1987 era estatisticamente impossível. De acordo com sua fórmula de probabilidades, publicada em 1985, a probabilidade do crash ers de um ¨evento 27 desvios-padrão longe da média¨, uma probabilidade 1 em 10 elevado à 160ª potência: ¨Mesmo se alguém tivesse vivido todos os 20 bilhões de anos em que existe vida no universo e experimentado isso 20 bilhões de vezes (20 bilhões de Big Bangs), seria praticamente impossível que uma queda dessa magnitude pudesse acontecer uma única vez nesse período¨ (Petterson, Scott, Mentes brilhantes, rombos bilionários, ed. Best business, 2012, p. 77).
Poucas vozes se levantaram contra este absurdo teórico, que nos governa há mais de dois séculos. Quando se levantaram foram abafadas. Greenspan foi alardeado como o gênio das finanças. Me pergunto qual teria sido o custo financeiro e social desta tese genial? Impossível quantificar. Qaunto a sociedade gasta com esses ¨gênios¨ em termos de salários, uso de instalções, etc, para que eles nos levem ao precipício? Basta uma crise como a de 2008 e as imediatamente anteriores para termos uma pequena ideia do caos (consultar Rogoff, Kennethh S. & Reinhart, Carmen M. em ¨Oito séculos de delírios financeiros). Convenhamos que deve ter alguma coisa de errado nesta teoria.
Enquanto isto, Warren Buffett, que nunca foi um adepto desta tese e que acredita que se pode ganhar da eficiência dos mercados, faz fortuna no mercado financeiro. E avisava: ¨Cuidado com a combinação nerds e números¨. Bom senso, não? Consta que a decisão de George Soros especular contra a libra surgiu de um encontro com o ministro inglês. Ou seja, de sua perspicácia em decifrar o posicionamento do ministro diante da situação econômica.
A teoria dos mercados perfeitos, principalmente quando aplicada aos mercados financeiros, também trouxe a hipótese de que as ações negociadas contêm todas as informações disponíveis no mercado e por isso estão devidamente precificadas, não havendo, consequentemente, possibilidades de investidores, aplicadores e especuladores vencerem os mercados, que são perfeitos. Esta hipótese pode ser tranquila e objetivamente refutada quando constatamos as verdadeiras fortunas que são feitas nesses mercados.
¨Como resultado, afirma a hipótese, não é possível para os investidores ganhar do mercado de forma consistente. O principal proponente dessa teoria é Eugene Fama, professor de finanças da Universidade de Chicago, que foi professor de Cliff Asness e de um exército de quants que, ironicamente, partiram para Wall Street para tentar ganhar do mercado nas décadas de 1990 e 2000. Muitos quants utilizavam estratégis semelhantes, derivadas do trabalho de Fama, que acabaram implodindo em agosto de 2007¨ (Patterson, Scott, Mentes brilhantes, rombos bilionários, ed. best business, 2012, p. 406). Alguma dúvida de que eram jogadores? Quanta incorerência. Se inspiraram em modelos e apostavam contra eles.
Se me perguntarem se somente é possível questionar a teoria dos mercados racionais e eficientes através da racionalidade eu, com toda a minha ignorância, respondo que não. Pode-se questioná-la através da experiência prática, da intuição, da observação, da percepção, das informações, privilegiadas ou não, da perspicácia, do feeling, do discernimento, da ponderação e do sentimento de que há falta de coerência na teoria.
Os exemplos mostram que para atuar e ter sucesso nesses mercados não é necessária uma formação acadêmica que leve em consideração esta hipótese. E mesmo os financistas com formação econômica se utilizam de suas aptidões e habilidades, sem seguirem esta suposição. É simples. Se seguissem não continuariam nele e não teriam sucesso econômico. Embora repitam em conversas, palestras e entrevistas não a levam em consideração em suas decisões.
As informações disponíveis não são suficiente para precificar de forma eficiente os ativos, por que existem informações manipuladas, outras falsas, que num primeiro momento não podem ser constatadas. Outrossim, estas informações precisam se concretizar para terem influência sobre os preços. Da mesma forma, o poder dos jogadores ou investidores, como queiram, geram expectativas de ganhos, que nem sempre são racionais. De antemão, não poderia predizer os efeitos de minha decisão sobre os preços, o que gera mais expectativs e indefinições. Expectativas têm alta dose de emoções que, necessariamente, não se baseiam em informações disponíveis. Decisões também se baseiam em expectativas, pressentimentos, desejos, emoções e outros fatores irracionais, como comportamentos de manada em épocas de crise. A aptidão e o amor pelo risco fogem a racionalidade.
Na verdade, pouco interessa se o mercado contém todas as informações disponíveis. Os negociadores, homens de negócio, especuladores ¨apostam¨ no devir, embora sejam ou pareçam ¨racionais¨ nas suas escolhas. E o devir é imponderável e imprevisível e, por isto, as ações ¨racionais¨ não podem levar a conclusões, soluções e consequências sempre satisfatórias, por serem pressupostamente ¨racionais¨.
Além disso, existem fatores ligados a genética e aos hormônios que influem em nosso comportamento e, consequentemente, em nossas decisões. Como consequência, a racionalidade de homens e mulheres têm peso diferente. E para a precificação ser eficiente tem que ser justa. E qual seria este parâmetro? O valor intrínseco? Então por que sobem e descem constantemente, sem qualquer lógica aparente ou justificável? E qual seria este valor intrínseco? ¨O preço seria o valor intrínseco dos ativos e seria alcançado com base em todas as informações disponíveis ao público¨(em Melo Pedro C. de, Crises financeiras, Editora Saint Paul, 2010, p.61). Ou seja, criou-se um círculo vicioso, em que preço é valor intrínseco e este é preço.
Mas, ao que parece, a teoria dos mercados perfeitos encontrou uma solução: ¨Se o mercado se movimentasse sem nenhuma razão aparente, isso tinha que significar que o mercado sabia alguma coisa que o pesquisador que o investigava não sabia¨(Fox, p.134). Meu Deus! Quanta racionalidade!
Acredito que, quanto mais elevado é o grau de um curso de economia (graduação, MBA, doutorado) maior deveria ser a necessidade de se estudar filosofia. Isto evitaria enunciados com tanta falta de lógica. As faculdades de economia deveriam ministrar cursos de filosofia, política, direito e até mesmo psicologia. Os economistas desprezam a filosofia e vivem em uma torre de marfim. Se acham responsáveis pelos desígnios do mundo.
Estas¨ciências¨ lidam com o ser humano, a sociedade. Consequentemente, a matemática e a econometria não são panacéias para todos os problemas sociais. A lógica da vida não é desvendada somente através de modelos econometricos mas, antes de tudo, com sensibilidade e bom senso. Alguns argumentos são tão simplórios e ridículos que sequer deveriam ser pronunciados por um ¨doutor¨.
Repetem estas bobagens com tanta autoridade que nos sentimos incapazes e até constrangidos em questioná-los. E o pior é que não se envergonham. Mais um enígma do comportamento humano, que nos traz dúvidas sobre a sua racionalidade.
FRIEDMAN, O GOVERNO E KEYNES
Cito novamente Fox: ¨Friedman acreditava que os mercados funcionavam melhor que o governo¨ (p.125); ¨Friedman é movido pela ideia de que o que quer que o governo faça está errado¨ zombou Franco Modigliani (p.124). Na verdade, não me dei ao trabalho de verificar se Friedman pronunciou qualquer frase com o mesmo teor. Infelizmente, é coerente com o seu pensamento. Se pronunciou algo igual ou parecido só demonstra a sua deficiência em filosofia, sociologia e política.
Existe coisa mais sem sentido e bom senso. Não se trata da questão de fazer melhor ou pior. Existem tarefas específicas que não podem ser desempenhadas pelo outro lado. Cabe ao governo administrar a moeda, estabelecer estímulos à economia, coibir atividades, práticas e processos que tragam danos à sociedade, aos seus membros e ao meio ambiente. Já imaginaram o setor privado administrando a moeda e a justiça, de acordo com os seus interesses particulares?
Ademais, tudo indica que falta ao economista um pouco de visão sociológica e até mesmo política da sociedade, pois o público e o privado, os fatos comprovam, não são necessariamente excludentes. Trata-se de uma relação simbiótica. O autor utilizou uma frase de efeitos psicológicos, ideológica, com o objetivo de justificar suas idéias pré-concebidas, de que os mercados são perfeitos e não precisam da interferência dos governos. Mas, não precisava se valer deste radicalismo inconsequente. Dessa forma, fugimos do campo da ciência ou do que a economia pretende ser. Como os extremos se tocam, suas idéias beiram ao anarquismo de Bakunin.
Não poderia deixar de destinar algumas palavras sobre Keynes. Este autor foi demasiadamente mal interpretado, principalmente em decorrência do arraigado pensamento e tradição ¨liberal¨ da sociedade americana, que por sinal domina ideologicamente o pensamento econômico, em escala mundial. Mas, ainda, por questões ideológicas daqueles que se serviram de sua teoria. Evidentemente, aqui, liberal tem a conotação de mercados racionais e perfeitos.
Entretanto, em seus trabalhos não encontrei qualquer menção ao fato de que os governos deviam assumir atividades empresariais. O autor era um liberal, não no sentido americano, acreditava na economia de mercado, na livre iniciativa e sabia da importância dos empresários na economia capitalista, como motores do progresso. A sua preocupação, pelo que me consta, era ¨salvar¨ o capitalismo, demonstrando que este sistema era vulnerável a crises periódicas e propondo soluções e alternativas para melhor contorná-las.
Acredito que uma de suas importantes ideias foi demonstar e propor a adoção de políticas monetária e fiscal, dependendo do momento em que a economia se encontrava. Ao contrário do monetarista Friedman que propunha uma taxa de crescimento regular da moeda.
O PARADOXO DA MÃO INVISÍVEL E DOS MERCADOS RACIONAIS
Vejamos o paradoxo. Para que uma economia capiltalista ¨funcione bem¨, segundo os seus ideólogos, os indivíduos devem ser racionais e buscar os interesses próprios, sem interferências externas, leia-se governo. Condição do sistema.
Por outro lado, ao mesmo tempo, teria que haver uma mão invisível, sobrenatural, talvez cósmica, irracional, por que a presunção é de que a racionalidade seja atributo do ser humano, assegurando que os benefícios sejam irradiados para todos. Também, nada a dizer como a mão invisível distribuirá tais benefícios, pois, supõe-se que sejam distribuídos também de forma eficiente.
De qualquer forma, a teoria econômica não nos diz nada sobre como estes comportamentos racionais e individuais se transformam em benefícios para todos. Para tanto, como única alternativa, lança mão da ¨mão invisível¨. Outrossim, não se sabe como estes benefícios seriam distribuídos. A mão invisível se encarregará de distribuí-los da forma mais eficiente e justa. Considerando que o comportamento humano também tem muito de irracional, pergunto: como justificar e explicar tanta irracionalidade? Em mais de dois séculos a economia não se libertou desses grilhões.
Neste contexto, a ideia de uma mão invisível soa como um absurdo e nada significa em termos de distribuição dos benefícios. Em outras palavras, estamos admitindo que a ¨suposta¨ racionalidade individual, que não é de todo racional, necessita da mão invisível, sobrenatural, irracional, para que os benefícios sejam alcançados. E isto é o que se chama de teoria econômica e que com a ajuda de modelos econométricos pretende alcançar o status de ciência. Obviamente, não precisamos de modelos matemáticos para constatar e comprovar tamanha incoerência.
Mesmo com a ajuda da mão invisível, os mercados não são eficientes para evitar as crises e para mitigar as grandes disparidades nacionais, regionais e individuais. Pelo contrário acirram estas disparidades. O que foi dito acima também serve como uma luva para a teoria das expectativas racionais. Esta é apenas mais uma derivação da teoria da racionalidade econômica do ser humano. Mas, se a racionalidade humana já é contestada o que dizer e esperar das ¨expectativas¨ racionais, que são, antes de tudo, expectativas? Convém lembrar que as mais diversas e ¨discrepantes teorias econômicas¨ foram e são elaboradas por pessoas extremamente racionais, o que já evidencia os retumbantes fracassos teóricos, que propiciam o caos econômico.
O fato de as crises serem inerentes ao capitalismo, os fatos demonstram, não significa que sejam boas, necessárias e inevitáveis ao bom funcionamento do sistema e a sua vitalidade e que por isso não devam ser evitadas. A teoria clássica também ¨acredita¨ que o capitalismo se renova com as crises. Outra incoerência, considerando que os mercados são eficientes. Estamos sentindo na própria carne e neste aspecto não precisamos dessa teoria economica.
Admitir tal pressuposto é reconhecer que as fases expansivas e especulativas seriam, pelo mesmo motivo, essenciais e benéficas. Ao abraçarmos estas presmissas estaríamos admitindo que os extremos nos trazem uma média que, no final, nos remeteria a uma eficácia ¨normal¨, necessária e plenamente satisfatória para a sociedade.
A TEORIA EM CONFRONTO COM A REALIDADE E COM O DIREITO
Diante de tanta ¨racionalidade¨, mão invisível e outras coisas mais uma pergunta é inevitável: se esta busca racional pelo interesse individual trouxesse benefícios sociais incontestáveis por que tantos danos ao meio ambiente? Então, poderíamos concluir que: o ser humano racionalmente queria tais resultados, o que é totalmente irracional; que sabia quais seriam as consequências, mas não se importa com elas, o que não só é irracional; que ele realmente não tem total controle sobre a sua racionalidade e, portanto, não é tão racional quanto se imagina e não pode, mesmo com a ajuda da mão invisível, garantir os benefícios pretendidos e decantados.
Segundo a mesma teoria econômica o mercado também é aquele ente que homogeniza as oportunidades distribuindo de forma eficaz e merecidamente, de acordo com a capacidade de cada, os recursos econômicos. Mas, para isto não deveria haver interferência nas leis que o regem. Então, o que dizer da exploração de crianças e das condições insalubres de trabalho? Em sentido contrário os governos estabelecem os salários mínimos.
Ao mesmo tempo em que ainda se apregoa estas ¨idéias¨ mundo afora, constata-se que elas estão na contramão com a realidade dos fatos e em total falta de sintonia com as necessidades da sociedade atual, que procura coibir, através de sanções penais e administrativas, esse individualismo desmensurado e absurdo, prejudicial a todos.
A título de exemplo: a Constituição Federal de 1988, no Titulo VIII-Da Ordem Social-, Capítulo VI, trata da preservação do meio ambiente; o artigo 170 estabelece os princípios que regem a ordem econômica, dentre os quais a função social da propriedade, a defesa do consumidor, a defesa do meio ambiente, a busca do pleno emprego; o Capítulo VII, da família, da criança e do idoso; os seus artigos 185 e 182 tratam especificamente da função social da propriedade rural e urbana; o artigo 187 do Código Civil de 2002 trata dos limites ao exercício do direito, nomeadamente o ¨abuso do direito¨ (não normatizado no Código Civil anterior); a Lei n. 8.078/90 protege e reconhece a vulnerabilidade e hipossuficiência do consumidor; as Leis ns 7.802/89 e 9.605/98 tratam dos danos ao meio ambiente e dos crimes ambientais, respectivamente. E o que dizer da proteção aos direitos difusos e coletivos, que são uma proteção ao patrimônio social?
O curto espaço não me permite discorrer sobre a importância de cada uma destas normas constitucionais e legais. Outrossim seria um traballho que foge a alçada deste texto. De qualquer forma, existe um extenso trabalho sobre estes assuntos.
Pergunto: estariam todos estas normas legais, que não privilegiam os interesses individuais, em dissonância com as necessidades de sociedade atual? No direito fala-se em diálogo das fontes. Por que não ter um diálogo entre direito, economia, sociologia e afins? Por que insistir neste absurdo teórico? A quem interessa? Parece mais uma neurose coletiva.
RESUMO
Conforme procurei demonstrar a teoria dos comportamentos racionais é uma versão mais aperfeiçoada, de grande impacto psicológico e ideológico, da teoria da mão invisível de Adam Smith e de outras assemelhadas.
Esta teoria se fundamenta no pressuposto do homo economicus que, por sua vez, deita raízes no pensamento liberaldo século XVIII.
Entretanto, além de ser incoerente em seus pressupostos básicos, não acompanhou os novos desafios das sociedades modernas e das novas teorias sobre a irracionalidade do comportamento do ser humano, renegando, inicialmente, o inconsciente freudiano e as novas pesquisas sobre o comportamento humano.
Além de sofrerem a influência ideológica do período do liberalismo, já plenamente ultrapassado tanto teórica como ideologicamente, perderam a conexão com a história.
Vai de encontro aos princípios jurídicos mais elementares que estão em consonância com as vicissitudes e as necessidades das sociedades atuais.
Vivem no passado e não contribuem para solucionar os problemas do presente e do futuro. São repetitivas e não criativas.
Já cumpriram as suas funções ideológicas e, por isso, merecem ser descartadas e banidas do ensino acadêmico. Servem quando muito para nos lembrar do passado trágico.
No final a mão invisível precisou da ajuda da mão visível do estado, o Sr. Greenspan fez uma mea culpa e todos, por enquanto, viraram keynesianos. O porquê nós já sabemos. Até quando?